quarta-feira, 27 de maio de 2009

Pérolas

Hoje sai com o cara mais gato da facul, chegando na casa dele percebi que iriamos transar numa beliche, até ai da-se um jeito, o problema mesmo foi ve-lo sair do quarto depois do sexo, voltar depois de uma hora e dizer "acho que comi algo estragado"

Hoje em dia todas as mulheres transam com seus namorados. Minha namorada é uma infeliz exceção.

Hoje na aula de eletrecidade eu estava com uma caneta na boca fazendo movimentos retilinios uniformes mas sem segundas intenções. Meus amigos acharam que eu estava fazendo sexo oral na caneta olhando para o professor. Agora todos acham que sou viado porque minha média foi 98,5.

Hoje a noite bebi absurdos e, pra minha surpresa, acordei azul. Quando perguntei o que se passava fiquei sabendo que, após vomitar, roubei de dentro do vaso sanitário aqueles negócios coloridos que dão cheiro e passei por todo meu corpo enquanto fazia danças sensuais.

Hoje estava com um vizinho, que acabei de conhecer, na porta da casa dele. Vi um suposto bêbado se aproximando e falei "porra, la vem esses bêbados chatos pedir dinheiro". O cara me vira e fala "esse é meu pai... ele ficou assim depois de um derrame e nao consegue andar normal"

Hoje, finalmente, depois de 3 meses no pé de uma mulher, consegui levá-la ao shopping. Ela levou o flho dela de 5 anos que me fez gastar uma grana nos games. Quando sentamos pra lanchar ele me perguntou: "Tio, você também é namorado da mamãe?".

Hoje eu estava transando com meu namorado quando ele pede para que eu vire de costas. Quando eu viro ele começa a cantar: "Oh Maria essa suruba me excita, Arrebita, arrebita, arrebita".

Hoje minha namorada me mandou um link de 'Aumente seu pênis'. Não era spam.


Vi no www.vidademerda.com.br

Órfãos do Ira!

Muita gente nem sabe ainda a razão do término de uma das maiores bandas nacionais. Uma coisa eu sei, Nasi ainda é uma metraladora giratória:

terça-feira, 26 de maio de 2009

Cheiro do ralo


Sadismo, perversão humana, humor negro, não sei se um desses eu todos. Só agora assiti o cheiro do ralo. Mais um excelente filme nacional. Quem ainda não viu, aconselho ver. Muito bom mesmo!



Nao sei aonde estou indo, mas sei que não estou perdido

Ultimamente estou afastado do blog. Se enumerar os motivos, não serão muitos. Eu poderia falar que é falta de tempo, mas não seria totalmente verdade...
Sabe quando está grilado só com duas coisas? O mundo e a humanidade.
Às vezes não sinto mais a tesão de postar, como sentia nos primeiros anos do blog.
Mas tentarei voltar... aos poucos ou de uma vez, não sei, mas voltarei.
Agora, uma música que estou com muita vontade de cantar pra muitas pessoas:

celular nos filmes

 
Este video e o anterior e copiei do blog mynameis

Heavy Metal Contra a Matança de Animais.

Bandas de thrash metal não é só apenas berros, pegadas fortes em guitarras e baterias. Algumas banda tem por finalidade transmitir alguma ideologia, na verdade a maioria delas, e das mais variadas.

Dois clipes de bandas de thrash metal, "Tourniquet" e "Sepultura" em músicas que falam da matança de animais, tanto para fins ciêntificos, fúteis e até mesmo para alimento. Fato combatido por todos naturalistas e vegetarianos por ai.

Com certeza uma ideologia muito válida e que deve realmente ser pensada.



Trecho do livro Pornô, de Irvine Welsh

Croxy, pela primeira vez na vida suando por causa de esforço físico emlivro_sexo vez de abuso de drogas, sobe tropeçando as escadas com a última caixa de discos nas mãos enquanto eu desabo na cama, entorpecido e deprimido, encarando de boca aberta o papel de parede bege. Isto é meu novo lar. Um quartinho de nada, de quatro por três, acompanhado por um corredor, uma cozinha e um banheiro. O quarto tem um armário embutido sem portas, minha cama e o espaço exato pra duas poltronas e uma mesa. Não tenho como sentar por aqui: até na prisão seria melhor. Porra, de repente é melhor voltar pra Edimburgo e sugerir que o Frank Begbie faça um negócio comigo, trocando sua cela por este muquifo gelado.

Neste espaço apertado, o fedor acumulado dos cigarros do Croxy é sufocante. Não fumo há três semanas, mas só de ficar perto dele consumo passivamente uns trinta cigarros por dia. Esse trabalho dá uma sede, hein Simon? Vem comigo pro Pepys pra tomar uma? - ele pergunta, e com seu entusiasmo triunfante parece estar querendo tirar um sarro das presentes circunstâncias humildes de Simon David Williamson.

Caralho, se por um lado seria uma loucura total descer pela Mare Street e entrar no Pepys, dando chance pra que todo mundo ria da minha cara e diga "Voltou pra Hackney, Simon?", porra, quero mesmo um pouco de companhia. Bater papo. Relaxar um pouco. Além do mais, seria bom arejar o Croxy. Tentar largar o cigarro na companhia do sujeito é como resolver parar com a heroína em um squat cheio de viciados.

- Você teve sorte de conseguir esse lugar - diz Croxy enquanto me ajuda a desembalar as caixas. Sorte o caralho. Fico deitado na cama e a casa toda se chacoalha quando o trem expresso pra Liverpool Street passa voando pela estação Hackney Downs, que fica a mais ou menos trinta centímetros de distância da janela da cozinha.

No meu estado de espírito, me recolher é uma opção ainda menos plausível que sair de casa, por isso descemos com cuidado pela escadaria deteriorada, com o tapete tão gasto que ficou perigoso como uma geleira. Do lado de fora, a chuva cai misturada com a neve e por todos os lados se percebe uma aura tediosa de ressaca festiva enquanto caminhamos na direção Mare Street e da prefeitura. Croxy, que não tem nenhum senso de ironia, fica dizendo que "Hackney é bem melhor que Islington, sem dúvida. Faz tempão que Islington tá uma merda completa".

segunda-feira, 18 de maio de 2009

Lust, Caution

de Ang Lee. Espionagem, romance… Uma linda protagonista. E contar mais que isso é estragar e entregar demais.

Trecho de Elza,a garota, de Sérgio Rodrigues

Elza Na noite de sábado, peguei o trem para São Paulo com mais três camaradas, dois que eu nem me lembro e o Guarani. Descemos na Estação da Luz na manhã do domingo, o domingo em que seria a passeata, junto com gente que vinha de tudo quanto era lado, de Santos, do Sul, do Rio, de Minas, estivadores do tamanho daquelas estátuas realistas-socialistas ao lado de funcionários públicos com óculos fundo-de-garrafa e musculatura de louva-deus – tinha de tudo. Na estação, já começamos a sentir o clima. Estava um dia bonito, e como tínhamos algumas horas para matar antes da passeata propus um passeio pela cidade, que eu não conhecia, mas o Guarani disse que o combinado era irmos direto para a casa de um camarada nosso, um gráfico chamado Enzo, que morava no Brás. Lá seria a concentração de alguns companheiros, almoçaríamos de graça antes de seguir num grupo maior para a Praça da Sé. Chegamos antes das dez e a casa já estava cheia. Era uma casa modesta, branca de janelas amarelas, mas tinha um quintal espaçoso com algumas árvores, uns bancos compridos de madeira debaixo de videiras, gaiolas de passarinho. Enzo, um italiano de fisionomia severa, bigodão, nos recebeu meio seco, mas a hospitalidade foi mais que garantida pela mulher dele, que era uma dona muito simpática, muito sorridente. Veio da cozinha de avental sujo avisar que o cardápio era macarronada com polpetone, me lembro disso como se fosse o almoço de ontem. No quintal, nos juntamos a um grupo que já devia ter vinte pessoas ou mais, todo mundo bebendo vinho. O Enzo tinha duas filhas, Francesca e Gina, que eles chamavam bem à italiana, Frantchesca e Djina. Duas deusas, uma Sophia Loren e uma Gina Lollobrigida, que ficavam zanzando lépidas de pés descalços, indo de grupinho em grupinho com os garrafões, enchendo copos, fazendo piadas, rindo para todo mundo. Mas este lugar é o paraíso, eu me lembro de ter pensado, enquanto o Guarani me cutucava para ir com calma na bebida. Isso não é festa, ele disse, deixa a festa para depois do trabalho. O trabalho era a porradaria contra os integralistas. Confesso que não segui à risca o conselho de Guarani e estava zonzo quando saímos da casa de Enzo rumo à guerra. Gina e Francesca também foram. Isso me deixou preocupado quando nos aproximamos do nosso ponto de encontro, que seria no Largo de São Bento, observados à distância por batalhões de policiais a cavalo, e eu comecei a ver gente com soco-inglês, porrete na mão, outros levando livros do Lênin, A Classe Operária, A Plebe ou A Manha enrolados em canudos, como se fossem para matar moscas. Mas a maioria de mãos abanando mesmo, olhos brilhantes de confiança e só. E precisava mais? Entendi então que ninguém estava preocupado com detalhes como força física ou experiência em escaramuças de rua, tinha muita mulher no meio, tinha até criança. Aquilo era uma festa cívica. Perdi Gina e Francesca de vista, mas relaxei. Um frisson absolutamente irresponsável, delicioso, percorria as fileiras antifascistas: era chegada a hora de acertar contas com aquela escória. Tínhamos gosto de sangue na boca, minha cabeça girava e eu acho que não era mais só por causa do vinho. Se Hitler e Mussolini estavam fora do alcance de nossos paus e pedras, os camisas-verdes de Plínio Salgado não estavam.

Eu seguia os comandos de companheiros que não conhecia, tudo uma confusão de gente e palavras de ordem, e já não via nem o Guarani nem conhecido nenhum. Mas sabia que o caos era apenas aparente. A estratégia militar tinha sido traçada pelo João Cabanas e pelo Roberto Sisson, caras que entendiam do riscado. Tinha pontos de concentração no Largo João Meneses, no pátio do Convento do Carmo, na Praça Ramos de Azevedo… Você conhece o centro de São Paulo? Dizem que a passeata dos galinhas-verdes chegou a tomar dois quilômetros da Brigadeiro Luiz Antônio, coisa de oito mil pessoas, não sei se é verdade. Só sei que, chegando na Praça, com mulheres e crianças fazendo o papel de abre-alas, bandeiras do Sigma tremulando, aquele rio verde começou a ser comprimido nas duas margens pelos rochedos vermelhos. Se eles eram oito mil, quantos seríamos nós? E a troca de insultos começou. Foi um tal de morra! pra cá, viva! pra lá, alguns mais esquentadinhos já começaram a sair no tapa ali mesmo. De repente, ouvimos tiros, mas era impossível saber de onde tinham vindo. Sentindo-se seguros com a proteção policial, que era de centenas de homens, uma fartura que eu nunca tinha visto de bombeiros, cavalarianos e policiais civis armados, os oradores integralistas começaram a discursar na escadaria da catedral debaixo de uma vaia de ensurdecer. Plínio Salgado, que não era besta, não apareceu, ficou com o rabo entre as pernas na sede do partido. Era impossível ouvir qualquer coisa. Eu comecei a suar em bicas no meio daquela panela de pressão, o sal me entrava nos olhos deformando tudo. De repente, bem claro, como se viesse do céu, um som picotado e inconfundível que até então eu só conhecia dos filmes de guerra: uma rajada de metralhadora. Por instinto, dei meia-volta e ia sair correndo, mas fui salvo do vexame por uma velhota de xale preto nos ombros, cara soturna de siciliana, que naquele momento me pareceu a própria Morte. Ela me agarrou o braço e disse: Coragem, homem. Sem graça, murmurei: É que eu preciso ir ao banheiro. Sei, respondeu a velha, já está se cagando. Tentei salvar a honra com um riso de desdém, mas tratei de sair rapidamente de perto da bruxa. De todo modo não fugi, tinha passado o impulso de covardia. Fui caminhando com lentidão estudada para a direita, na direção de um grupo mais denso onde naquele momento, em cima de um caixote, começava a improvisar um pequeno comício paralelo um sujeito que eu reconheci das fotos dos jornais que lia na casa do meu tio João Mateus: era Edgard Leuenroth, o grande líder anarquista. Fiquei por ali, aplaudindo cada palavra dele como se aplaudisse meu próprio passado. Percebi que pequenos comícios como aquele iam pipocando em outros pontos da praça. E de repente o tiroteio rebentou de vez.

Nunca se soube quem começou. As balas zuniam, corria gente para todo lado, e tome pop-pop-pop. Fui procurar proteção atrás de uma árvore e no caminho vi que a velha com cara de siciliana continuava impassível em seu lugar, plantada lá com seus sapatos pretos: era a única pessoa parada no meio daquele redemoinho de gente, como se fosse o próprio eixo da roda de insanidade em que se transformara a Praça da Sé. Vi pessoas caindo, não sei se porque tinham sido alvejadas ou porque tropeçavam mesmo, mas de uma forma ou de outra eram pisadas por quem vinha atrás, e ouvi gritos de dor, uivos de pânico, ordens contraditórias, por aqui, calma, para cima, é agora, socorro! De repente, um garoto camisa-verde mais desorientado cruzou na minha frente e sem pensar eu lhe mandei um murro bem no meio do nariz. Ele caiu de joelhos e começou a chorar feito um bebê, o sangue jorrando. Muito bem, companheiro, senti tapinhas nas costas quando finalmente alcancei a árvore que mantinha na mira. A dor em minha mão era aguda.

Os tiros tinham ficado mais esparsos, o frenesi começou a baixar. Alguém gritou que os galinhas estavam batendo em retirada, e era verdade: a Praça da Sé excretava jatos verdes por todos os poros, uma cena linda. Alguns arrancavam as camisas enquanto corriam, tentando se livrar da cor que os denunciava, e essas peças infames eram coletadas por companheiros eufóricos, que as erguiam como troféus, berrando: Vitória! Vitória!

Trechos do diário de William Burroughs

2f9715e72b3f *Sábado, 3 de maio de 1997.

O caviar chegou. Sabe, filho, quando o sujeito se vicia em caviar Beluga, não há nada que não fará para satisfazer a fome de caviar que o consome.

Ele pode mentir, trapacear, pode até matar para conseguir uma porção. Pode chegar ao ponto em que nem humano é mais. Apenas um veículo para a vil prostituta troiana russa, oferecendo seu produto mortífero.

Posso imaginar alguém indo à falência de tanto comprar o melhor Beluga. Um dia ele chega a sua casa e sua filha de 15 anos e outros adolescentes estão comendo seu Beluga, acompanhado de milk-shake.

"Venha se juntar à festa, pai." Ela ergue o vidro vazio. "Chegou tarde." Ele seria capaz de matar todos, se não tivesse caído morto pela "Falta de Caviar na Hora Certa".

* Segunda, 5 de maio.

Allen morreu no dia 5 de abril de 1997.
Is it not time to
Dance and sing
While the bell of 
Death do ring?
Turn on the toe
Sing out "Hey Nanny Noo".

* Segunda, 12 de maio.

Lembro no sonho que eu era jovem, com a vida toda à minha frente, em 1890, cidade pequena, cheia de gente simpática. 
Gente simpática e ignorante. Eu não estava com pressa nenhuma. Dólares de prata chacoalhando no meu jeans. Na época em que um dólar comprava um banquete.

Acompanhado de um vinho francês da melhor safra e, é claro, do melhor caviar Beluga. Ou então você podia pagar uma boa transa. Qualquer tamanho, raça ou cor.

Então, onde foi que erramos? Acho que o erro sempre esteve ali. ''Segurança, a máscara amigável da transformação. Para a qual sorrimos, sem vermos o que sorri por trás dela.'' (Edwin Arlington Robinson)

Sinto-me frio e envelhecido. Sinto-me como Teiresias, morto há 15 dias, e as ondas desnudando seus ossos em sussurros _aquelas velhas, velhas palavras. Tantas cenas terríveis com _esqueça, desative, deixe pra lá, é apenas sua memória agora, remova-a. Você tem o poder de fazê-lo.

* Sábado, 24 de maio.

Dia legal a quarta-feira com a banda ME TOO (U2) em Kansas City. Gosto dessas apresentações públicas _como injeções de boa vontade recíproca sincera.
I'll go right back where
the bullets fly and
stay on the cow
until I die.

Aqui eu desabo, rindo. Tentando pensar numa leitura realmente nova que consiga transmitir quem sou e por que estou aqui. Tenho que fazer isso.

Começamos com a grande e feia mentira americana. Allen Ginsberg, segundo George Will, construiu sua carreira a partir das disfunções da Sociedade Americana.

Allen roeu um furo na Mentira; foi dele o Uivo ouvido no mundo todo, da Cidade do México até Pequim, o Uivo da juventude distorcida, sufocada.

A influência mundial de Allen foi algo sem precedentes. Ele, com a coragem de sua sinceridade total, encantou e desarmou as selvagens Feras da Fraternidade Estudantil.

* Domingo, 25 de maio.

Todos os governos são erguidos sobre mentiras. Todas as organizações são erguidas sobre mentiras. As mentiras podem ser inofensivas, como a mentira da droga milagrosa, a metadona, que supostamente remove o desejo de heroína (claro, como o gim alivia a necessidade de uísque).

A droga surgiu em meio a mentiras explicadas a mim por um dos primeiros médicos.

A metadona é a primeira síntese bem-sucedida da molécula de morfina. Em Tânger, tive um hábito de dois anos de metadona injetável que era droga pura.

Quem são os malucos antidrogas? De onde vêm?

Fato: a cannabis é uma das melhores drogas para combater a náusea, aumenta o apetite e o bem-estar.

Também estimula os centros visuais cerebrais. Já tive tantas imagens ótimas conseguidas com cannabis. Na minha época de saladas, eu usava só ela, e que realizações consegui! (''E que acasalamentos!'', como exclamou um crítico francês admirado.)

Algumas tragadas na teta verde e consigo enxergar múltiplas saídas e caminhos. Então por que tanta repressão a essa substância inofensiva e prazerosa?

Quem é você, para quem a verdade é tão perigosa? O que é a verdade? Algo imediatamente percebido como sendo a verdade.

Allen abriu rombos na Grande Mentira, não apenas com sua poesia, mas com sua presença, sua verdade espiritual auto-evidente.

Últimas palavras ''dois a cinco meses, os médicos disseram'', disse Allen, ''mas eu acho que vai ser muito menos''. 
Depois ele me disse: ''Achei que ficaria apavorado, mas estou totalmente feliz!''. Suas últimas palavras a mim. Eu me recordo de falar com ele pelo telefone antes do diagnóstico fatal, e já estava ali em sua voz _distante, fraca. Então eu soube.

* Segunda, 26 de maio.

A busca da resposta final _o Santo Graal, a Pedra Filosofal. Uma miragem que se distancia. De qualquer modo, quem quer uma resposta final? 
Perguntei a um físico japonês: ''Você realmente quer conhecer o segredo do universo?''. Ele disse: ''Sim''. Pensei que uma pequena fração desse segredo seria o suficiente para fazer você subir pela parede. Quanto a mim, só quero saber o que preciso saber para fazer o que preciso fazer. ''Sou apenas um Sargento Técnico.''

Será que quero saber? Já tentei psicanálise, ioga, o método de posturas de Alexander, fiz um seminário com Robert Monroe, fiz viagens para fora do corpo, Cientologia e saunas indígenas.

Procurando uma resposta? Por quê? Você quer saber o segredo? Nada disso. Tudo está no que não está feito.
Onde estão a cavalaria, a nave espacial, o esquadrão de resgate? Fomos abandonados aqui neste planeta governado por filhos da puta mentirosos, de poder cerebral modesto. Sem sentido. Nem uma minúscula fração de boas intenções. Filhos da puta mentirosos.

* Sexta, 30 de maio.

Uma revisão da vida não é um relato ordenado, da concepção até a morte. São fragmentos daqui e dali. Um telefonema. Um recado, meus óculos estão prontos. ''O senhor pode se sentir bastante bem com codeína.''

Um comentário: ''Ele parece um cão matador de ovelhas''. Dito a meu respeito por Pollet Elvins, pai de Kells, que, mais tarde, enlouqueceu de paresia.

* Sábado, 31 de maio.

Sobre seu rosto, uma sucessão de imagens da história do homem do século 20. A Segunda Guerra Mundial, a chegada à Lua. Burroughs com um terno negro e um chapéu. Uma figura sinistra.

Pouco antes de sua morte, dizia adorar apenas os gatos que circulavam por sua casa e pensava profundamente sobre caviar.

Sentia horror por uma sociedade que criava estado policial para controlar o desejo de fumar um cigarro no trabalho, bar e restaurante. Duvidava da qualidade de vida. Tinha fé apenas em si mesmo.

Aquele réptil asqueroso Gingrich, dedo-duro do Congresso, anda falando imbecilidades sobre uma América livre de drogas até o ano 2001. Perspectiva deprimente!

É claro que não estão incluídos álcool e cigarros, cujo consumo vai aumentar vertiginosamente. Como se pode ter um Estado livre de drogas? Simples. Uma operação pode remover os receptores de drogas do cérebro.

Quem se recusar a fazer a cirurgia será privado de todos os seus direitos. Eles não vão poder alugar casa, os restaurantes e bares vão se negar a atendê-los. Não terão passaporte, nem benefícios sociais, nem cobertura médica, nem direito de comprar armas de fogo.

Como odeio os que se dedicam a gerar conformismo. Com que objetivo? Imagine a banalidade estéril de uma América livre de drogas.

Nada de drogados, apenas bons e decentes americanos de vida limpa, de uma costa brilhante à outra. Toda a área da dissensão extirpada, como um furúnculo.

Nada de favelas. Nada de regiões de operações clandestinas vagas. Nada de nada. Ali fora, nas ruas impiedosas do meio-dia. Nada de cartas.

Até que ponto será bom ter conformismo total? Que lugar vai sobrar para a singularidade? E a personalidade? E você e eu?

* Quarta, 4 de junho.

''J'aime ces types vicieux, qu'ici montrent la bite.'' Gosto dos tipos sacanas que mostram o pau aqui. Anônimo, num mictório de Paris.

''Não é ótimo cantar e dançar enquanto os sinos da morte tocam e giram na ponta dos pés e cantar 'Hey Nanny Noo'.'' Sim, amo a vida em toda sua diversidade, mas enfim o sino toca, assinalando a chegada da noite.

* Sexta, 6 de junho.

Fico imaginando qual será o futuro do romance ou de qualquer forma de escrita. Depois de Conrad, Rimbaud, Genet, Beckett, Saint-John Perse, Kafka, James Joyce, Paul Bowles e Jane Bowles.

Com Paul, havia uma escuridão sinistra, como um filme sub-revelado. Com Jane? Como seus personagens se movem?
É especial demais para formular em palavras. O que resta a ser dito? Ah, esqueci-me de Graham Greene. Talvez houvesse justamente aquele tanto de ''sumo'', como Hemingway costumava dizer, mas não o suficiente para uní-lo a Joyce e aos poucos eleitos.

Faltou um pouquinho. Ele se matou de vaidade e auto-inflação, e aí o balão se rompeu. Ele sabia que estava acabado. ''A coisa não vem mais.'' Ele não estava mais ali, simplesmente.

Voltando à literatura. Talvez não haja mais nada a dizer. Conrad disse muito do que havia a se dizer em ''Under Western Eyes'' e ''Lord Jim'', e Genet o disse na costa espanhola.

Posso sentir sua fome, descendo ao lado do cais onde o pescador às vezes lhe atirava um peixe, que ele assava sobre uma fogueira de gravetos e comia sem sal.

Para que continuar? ''O bonde descreveu uma curva larga em 'u' e parou; era o fim da linha.'' Paul Bowles no final de ''Sheltering Sky''. Céu. Não consigo nem mesmo escrever a palavra céu. Acho que sinto _para que continuar?

* Sexta, 1º de agosto.

Amor? O que é? O analgésico mais natural. O que há. AMOR.

Tradução Clara Allain

Trecho de O Pequeno Príncipe, de Antoine Saint-Exupéry

pequeno-principe

O pequeno príncipe atravessou o deserto e encontrou apenas uma  flor. Uma flor de três pétalas, uma florzinha insignificante....

- Bom dia - disse o príncipe.

- Bom dia - disse a flor.

- Onde estão os homens? - Perguntou ele educadamente.

A flor, um dia, vira passar uma caravana:

- Os homens? Eu creio que existem seis ou sete. Vi-os faz muito tempo. Mas não se pode nunca saber onde se encontram. O vento os leva. Eles não têm raízes. Eles não gostam das raízes.

-Adeus - disse o principezinho.

-Adeus - disse a flor.

O pequeno príncipe escalou uma grande montanha. As únicas montanhas que conhecera eram os três vulcões que batiam no joelho. O vulcão extinto servia-lhe de tamborete. "De uma montanha tão alta como esta", pensava ele, "verei todo o planeta e todos os homens..." Mas só viu pedras pontudas, como agulhas.

- Bom dia! - disse ele ao léu.

- Bom dia... bom dia... bom dia... - respondeu o eco.

- Quem és tu? - perguntou o principezinho.

- Quem és tu... quem és tu... quem és tu... - respondeu o eco.

- Sejam meus amigos, eu estou só... - disse ele.

- Estou só... estou só... estou só... - respondeu o eco.

"Que planeta engraçado!", pensou então. "É completamente seco, pontudo e salgado. E os homens não têm imaginação. Repetem o que a gente diz... No meu planeta eu tinha uma flor; e era sempre ela que falava primeiro."

Mas aconteceu que o pequeno príncipe, tendo andado muito tempo pelas areias, pelas rochas e pela neve, descobriu, enfim, uma estrada. E as estradas vão todas em direção aos homens.

- Bom dia! - disse ele.

Era um jardim cheio de rosas.

- Bom dia! - disseram as rosas.

Ele as contemplou. Eram todas iguais à sua flor.

- Quem sois? - perguntou ele espantado.

- Somos as rosas - responderam elas.

- Ah! - exclamou o principezinho...

E ele se sentiu profundamente infeliz. Sua flor lhe havia dito que ele era a única de sua espécie em todo o Universo. E eis que havia cinco mil, iguaizinhas, num só jardim!

"Ela teria se envergonhado", pensou ele, "se visse isto... Começaria a tossir, simularia morrer, para escapar ao ridículo. E eu seria obrigado a fingir que cuidava dela; porque senão, só para me humilhar, ela seria bem capaz de morrer de verdade..."

Depois, refletiu ainda: "Eu me julgava rico por ter uma flor única, e possuo apenas uma rosa comum. Uma rosa e três vulcões que não passam do meu joelho, estando um, talvez, extinto para sempre. Isso não faz de mim um príncipe muito poderoso..."

E, deitado na relva, ele chorou.

E foi então que apareceu a raposa:

- Bom dia - disse a raposa.

- Bom dia - respondeu educadamente o pequeno príncipe, olhando a sua volta, nada viu.

- Eu estou aqui - disse a voz, debaixo da macieira...

- Quem és tu? - Perguntou o principezinho. - Tu és bem bonita...

- Sou uma raposa - disse a raposa.

- Vem brincar comigo - propôs ele. - Estou tão triste...

-Eu não posso brincar contigo - disse a raposa. - Não me cativaram ainda.

- Ah! Desculpa - disse o principezinho.

Mas, após refletir, acrescentou:

- Que quer dizer "cativar"?

- Tu não és daqui - disse a raposa. - Que procuras?

- Procuro os homens - disse o pequeno príncipe. - Que quer dizer "cativar"?

- Os homens - disse a raposa - têm fuzis e caçam. É assustador! Criam galinhas também. É a única coisa que fazem de interessante. Tu procuras galinhas?

- Não - disse o príncipe. - Eu procuro amigos. Que quer dizer "cativar"?

- É algo quase sempre esquecido - disse a raposa. Significa "criar laços"...

- Criar laços?

- Exatamente - disse a raposa. - Tu não és ainda para mim senão um garoto inteiramente igual a cem mil outros garotos. E eu não tenho necessidade de ti. E tu também não tens necessidade de ti. E tu também não tens necessidade de mim. Não passo a teus olhos de uma raposa igual a cem mil outras raposas. Mas, se tu me cativas, nós teremos necessidade um do outro. Serás para mim único no mundo. E eu serei para ti única no mundo...

- Começo a compreender - disse o pequeno príncipe. - Existe uma flor... eu creio que ela me cativou...

- É possível - disse a raposa. - Vê-se tanta coisa na Terra...

- Oh! Não foi na Terra - disse o principezinho.

- A raposa pareceu intrigada:

- Num outro planeta?

- Sim.

- Há caçadores nesse planeta?

- Não.

- Que bom! E galinhas?

- Também não.

- Nada é perfeito - suspirou a raposa.

quarta-feira, 13 de maio de 2009

Faz lembrar alguma coisa?



Animação conta história de velhinho que viaja suspenso por balões.
Longa-metragem foi exibido nesta manhã na programação de Cannes.

Legalize Já.

Até o ministro do meio ambiente foi na marcha para a liberação da cannabis.
Ele também queima uma matinho..





derrr

- A panela de pressão é de alumínio.
- Eu tenho tanta preguiça que evito durmir para não ter o trabalho de acordar.
- Sou demorado pra fazer as coisas, comecei a morrer no dia que nasci e até hoje não terminei…
- Se quiser falar comigo, diga alguma coisa.
- Eu me amo tanto que nunca vou me separar de mim mesmo.

Essas e muito mais frases bem derrr mesmo, vc encontra no www.derrr.com.br, veja alguns frases e mande também as suas!
Excelente blog, recomendo!

O papa tá com aids

"alguem me disse não acreditei, até me deram um choque pra ver se sonhei, foi quando deu no rádio e na televisão, o papa tá com aids, nao é alucinação"

Pedra Leticia


Sei que deveria ter postado aqui antes sobre os shows em Goiânia. Mas antes tarde do que mais tarde ainda...
Show no Flamboyant inconcert: excelente, tava com saudade de ver Pedra Leticia cantando novamente em Goiânia, pena que fiquei do lado do palco, ouvindo somente o retorno (nunca tinha visto Flamboyant tão lotado).
Show na bienal do livro: esse sim... fiquei de frente o palco. O bom do show é que voce diverte o tempo todo, nossa, a presença de palco deles é espetacular!!! A diversão é garantida.
Mas por que só agora as postagens?
Não viram?
Pedra Leticia ganhou concurso bandas de garagem do domingão do faustao (ele é insuportável, também nao vi).
Mas fazer o que... agora eles vão no faustão... vou ser obrigado a assistir...
Para quem não conhece (ou ainda nao tem as musicas) vai aí o link para baixar o CD.
Link

Raul Seixas

Depois de sumir... estou de volta. Eu também vou reclamar!

as palavras de Lord Byron

O Enterro

gothic-chatty-cathy No ano de 17.., depois de haver meditado por algum tempo sobre a possibilidade de viajar por países que até agora os viajantes não freqüentam muito, parti em companhia de um amigo, ao qual me referirei como August Darvell.

Era uns anos mais velho que eu, um homem de fortuna considerável e família de próspera. Vantagens que ele nem desprezava nem superestimava, graças a sua grande capacidade. Algumas circunstâncias singulares em sua historia pessoal o haviam convertido para em objeto de atenção, interesse e até de estima, que não diminuíam nem seus modos reservados nem as ocasionais mostras de angústia que às vezes o acometiam e o levavam a uma alienação mental.

Eu era todavia um jovem e havia começado a viver cedo; porém mi intimidade com ele era recente: assistimos a as mesmas escolas e universidade; mas seu passo por elas me havia precedido, e ele já se havia iniciado a fundo no que se tem chamado o mundo, enquanto eu estava no noviciado. Durante esse tempo, escutei detalhes em abundância tanto de sua vida passada como da presente e, ainda que nestas narrações havia muitas e irreconciliáveis contradições, podia eu inferir que ele não era um ser comum, senão alguém que, ainda que se esforçasse por não ser conspícuo, seguia sendo notável.

Havia travado conhecimento com ele e tentei conquistar posteriormente sua amizade, porém parecia que esta era inalcançável; os afetos que pudesse haver sentido aparentavam ter-se extinguido. Tive suficientes oportunidades para observar que seus sentimentos eram intensos; pois mesmo quando os podia controlar, lhe era impossível encobri-los por completo; sem embargo, tinha a faculdade de dar a uma paixão a aparência de outra, de modo que resultava difícil definir a natureza do que sucedia em seu interior; e as expressões de seu rosto podiam variar com tal rapidez, ainda que ligeiramente, o que resultava inútil tratar de esquadrinhar sua origem.

Era manifesto como o dominava uma angústia incurável; porém nunca pude descobrir se era causa a ambição, o amor, o remorso ou a pena, um só ou todos juntos, ou apenas por um temperamento mórbido, semelhante a uma enfermidade. Existiam circunstâncias supostas que poderiam justificar sua atribuição a qualquer destas causas; porém como antes disse, estas eram tão contrárias e contraditórias que nenhuma podia considerar-se definitiva.

Se supõe geralmente que onde há mistério existe também a perversidade: não sei como pode ser isto, porém é um fato que não existia o primeiro ainda que não poderia atestar os alcances da segunda —e estava pouco disposto, no que a ele se referia, a crer em sua existência. Recebia minha proximidade com bastante reserva; mas eu era jovem e difícil para o desalento; e, com o tempo, tive êxito ao entabular, até certo ponto, esse vinculo comum e essa confiança moderada dos interesses mútuos e cotidianos que criam e cimentam a comunhão de empenhos, e a frequência de encontros que se chama intimidade ou amizade segundo as idéias de quem utilizam essas palavras para sua expressão.

Darvell havia viajado muito; dirigi-me a ele para que me aconselhasse a respeito da viagem que pretendia realizar. Era meu desejo secreto que se deixasse persuadir a me acompanhar; ademais, era uma perspectiva improvável; baseada na vaga inquietude que havia observado nele e à qual davam renovada força ao entusiasmo que parecia sentir para tais temas e sua aparente indiferença por tudo o que o rodeava muito de perto.

A principio insinuei meu desejo e depois o expressei abertamente: sua resposta, ainda que eu a esperasse em alguma medida, me deu todo o prazer de uma surpresa: aceitou e, ao término dos preparativos necessários, começamos nossa travessia.

Depois de viajar por vários países do sul de Europa, voltamos a atenção para o Leste, de acordo com nosso destino original; e foi em nosso percurso através de estas regiões que ocurreu o incidente que dá ocasião a meu relato.

A complexão de Darvell, que, dada sua aparência, devia haver sido em sua juventude mais robusta que o normal, estava decaindo gradualmente desde algum tempo, sem que nenhuma enfermidade se manifestasse: não tinha tosse nem tísica; contudo, cada dia se debilitava mais; sues hábitos eram moderados, não admitia nem se queixava de fatiga; não obstante, era evidente que se estava consumindo: se volta cada vez mais e mais silencioso e insone e, por fim, se alterou de tão notável maneira que minha preocupação aumentou de maneira proporcional ao perigo que eu considerei lhe ameaçava.

A nossa chegada a Esmirna, nos havíamos proposto ir a uma excursão às ruínas de Éfeso e Sardis, da qual tentei dissuadi-lo devido à sua indisposição —porém em vão: parecia existir uma opressão em sua mente, e uma solenidade em seus modos que não correspondiam com sua ansiedade para seguir com o que eu considerava uma simples viagem de prazer, totalmente inadequado para uma pessoa delicada; porém não me opus mais, e uns dias depois partimos em companhia unicamente de um guia e um carregador.

Havíamos percorrido a metade do caminho até os vestígios e Éfeso, deixando atrás os contornos mas férteis de Esmirna e nos adentrávamos nessa região inóspita e desabitada através dos pântanos e desfiladeiros que levam às poucas choças que subsistem sobre as destroçadas colunas de Diana —as paredes sem teto da cristandade expulsa e mesmo mais recente porém total desolação das mesquitas abandonadas— quando a súbita e vertiginosa enfermidade de meu companheiro nos obrigou a deter-nos em um cemitério turco, cujas lápides coroadas de turbantes eram o único indicio de que a vida humana havia morado alguma vez nesse ermo. A única caravana que vimos havia passado umas horas atrás; não se podia ver nem esperar vestígio algum de povo ou sequer de caravana, e esta “cidade dos mortos” parecia ser o único refúgio para meu desafortunado amigo, que se via próximo a converter-se em seu seguinte morador.

Nesta situação, busquei pelos arredores um lugar no que pudesse repousar com mais comodidade: ao contrário do aspecto usual dos cemitérios maometanos, os ciprestes deste eram escassos, espalhados sobre toda a superfície; a maioria das tumbas estavam destruídas e desgastadas pelos anos: sob uma das maiores e sob uma das árvores mais frondosas, Darvell se apoiou, inclinando-se com grande dificuldade. Pediu água. Eu duvidava que pudéssemos encontrá-la, ainda que me dispusesse ir buscá-la apesar de meu desalento: porém ele desejava que eu permanecesse com ele; e voltando-se para Suleiman, nosso carregador, que fumava com grande tranqüilidade, lhe disse:

—Suleimán, verbena su— ( ou seja, traz-me um pouco de água) e continuou descrevendo-lhe com grande detalhe o ponto onde poderia encontrá-la. Era um pequeno poço para camelos, algumas centenas de jardas à direita. O jenizaro obedeceu.

Disse a Darvell:

— Como sabes isso?

—Por nossa posição— revelou —você deve notar que o lugar esteve habitado alguma vez e não poderia ser diferente se não houvesse mananciais. Ademais, já estive aqui antes.

—Você já esteve aqui! Como nunca o mencionou? E que fazia você em lugar semelhante onde nada pode permanecer um momento mais sem pedir ajuda?

A esta pergunta não recebi resposta alguma. Enquanto isso, Suleimán regressou com a água e deixou o guia e os cavalos na fonte. Parecia que ao mitigar sua sede Darvell reviveu por um momento; e alberguei a esperança de que pudesse continuar, ou pelo menos regressar, e o exortei a tentá-lo.

Ele guardou silêncio. Parecia pôr ordem em seus pensamentos antes de se esforçar para falar.

—Este é o fim de minha jornada —começou— e de minha vida; vim até aqui para morrer; porém tenho uma súplica a fazer: uma ordem que dar, pois tais devem ser minhas últimas palavras. Cumprirás?

—Desde logo; porém tenho melhores intenções.

—Eu não tenho esperanças, nem desejos, senão este: oculte minha morte a todo ser humano.

—Espero que não se presente a ocasião; você se recuperará e…

—Silêncio!, assim deve ser: prometa.

—Sim.

—Jure — aqui pronunciou um juramento de grande solenidade.

—Não há razão para tal, eu cumprirei com seu pedido; e duvidar de mim é…

—Não posso evitar, deve você jurar.

Pronunciei o juramento e isso pareceu aliviá-lo. Tirou do dedo um anel de selo, que tinha gravados alguns caracteres arábicos, e me deu.

—No nono dia do mês — continuou—, precisamente ao meio-dia (o mês que você gostar, porém o dia deve ser esse) você deverá arrojar este anel às fontes de água salgada que alimentam a baia de Eleusis. No dia seguinte, à mesma hora, deverá dirigir-se às ruínas do templo de Ceres e esperar uma hora…

—Para que?

—Já o verá

—Disse você que é o nono dia do mês?

—O nono.

Quando fiz a observação de que o presente era o nono dia do mês, seu semblante mudou e fez pausa. Enquanto estava sentado, debilitando-se visivelmente, uma cegonha com uma serpente no bico pousou sobre uma tumba próxima a nós; e, sem devorar sua presa, dava a impressão de nos observar fixamente. Não sei o que me impulsionou a espantá-la, porém o intento foi inútil; fez alguns círculos no ar e regressou exatamente ao mesmo lugar. Darvell apontou-a e sorriu. Falou —não sei se para si mesmo ou para mim – porém as palavras só foram:

—Está bem.

—Que é que está bem? Que queres dizer?

—Não importa; você deverá enterrar-me aqui esta noite, e no ponto exato em que está parada essa ave. Já conhece você o resto de minhas ordens.

Então começou a dar-me algumas instruções sobre como poderia ocultar melhor sua morte. Quando terminou, disse:

—Vê você essa ave?

—Claro.

—E a serpente que se retorce em seu bico?

—Sem dúvida; não há nada raro; é sua presa natural. Porém é estranho que não a devore.

Riu-se de uma maneira espectral e disse languidamente:

—Todavia não é o momento.

Enquanto falava, a cegonha empreendeu o voo. Segui-a com os olhos um instante: não pude haver tardado mais que em contar dez. Senti aumentar o peso de Darvell, por pouco que fosse, sobre meu ombro e, ao voltar a ver seu rosto, vi que havia morrido.

Impressionou-me a repentina certeza inconfundível: em poucos minutos seu semblante se tornou quase negro. Pudesse atribuir essa mudança tão rápida à ação de algum veneno, se não estivesse consciente de que não teve oportunidade alguma de tomá-lo sem que eu me desse conta. O dia se acercava a seu final, o corpo se decomporia com rapidez. Não restava nada mais que cumprir seu pedido. Com ajuda do iatagán,de Suleimán e de meu próprio sabre, escavamos uma tumba pouco profunda no sitio que Darvell havia indicado: a terra cedeu com facilidade: tempo atrás havia recebido um ocupante maometano.

Cavamos o mais profundo que o tempo permitiu e, arrojando a terra seca sobre tudo o que restava do ser tão singular que acabava de partir, cortamos alguns ramos do cipreste mais verde que crescia na terra menos desgastada que nos rodeava e o colocamos sobre seu sepulcro.

Entre o assombro e a pena, não podia derramar uma lágrima.

quinta-feira, 7 de maio de 2009

academia umbrella

14485

Um quadrinho de primeira. Enquanto a Devir não publica aqui, você pode baixar e ler no VERTIGEM, ótimo site de scans que eu acompanho já faz um tempo.

as palavras de marçal aquino

A MISSÃO

images Da penumbra, oculto por um pilar, ele observou o homem atravessar o pátio. Um grandalhão com cara de sádico, armado com um cassetete. Poderia atacá-lo de surpresa, ele considerou, enquanto o homem se detinha e espiava ao redor, atento. Mas estava sem sua pistola e resolveu não correr riscos desnecessários. Preferiu esperar que o vigia terminasse a ronda.
Assim que se desfez no ar o som que o homem produziu, ao fechar atrás de si uma pesada porta de ferro, ele se moveu. Cruzou o pátio, aumentando a velocidade e a largura dos passos ao passar pela zona iluminada. De novo na penumbra, manteve-se imóvel por um tempo, recuperando o controle da respiração, o coração batendo acelerado. Ele conhecia bem o inimigo, sabia o que o aguardava se fosse apanhado. Mas isso não aconteceria. E o medo não iria impedi-lo de cumprir sua missão.
Um cachorro latiu em algum lugar ali perto. Ele aguçou os ouvidos, prendeu a respiração. E esperou. Nada aconteceu. O pátio continuou deserto e silencioso, azulado pela luz da lua.
A arma fazia falta, ele pensou. Com ela na mão, estaria mais confiante. Mas profissionais como ele eram preparados para lidar com situações adversas. Então deixou a penumbra e começou a galgar a calha, apoiando-se nas emendas. Cada movimento desprendia um ruído preocupante da estrutura de metal. Se a calha cedesse ao seu peso, ele olhou para baixo, seria uma queda e tanto. Foi nesse momento que escutou o barulho da chave na porta de ferro. E, com um arranque que fez ranger a calha inteira, alcançou a mureta e passou ao segundo piso.
Ali, permaneceu agachado, de olho no pátio. O som da calha ainda retinia em seu ouvido quando o grandalhão surgiu na área iluminada. Por um segundo, teve a impressão de que o homem olhou em sua direção e isso ó deixou tenso, com os músculos retesados. Mas o vigia parecia despreocupado: assobiava e batia o cassetete na palma da mão enquanto fazia o trajeto até o lado oposto do pátio.
Ele se levantou e passou a um corredor comprido, fracamente iluminado. Andava com cautela, pisando em silêncio, como um gato — fora treinado para isso. Até que, no final do corredor, uma porta trancada o deteve. Poderia arrombá-la com o ombro, mas na certa seria denunciado pelo barulho. Por isso, abaixou-se e forçou a maçaneta várias vezes, sem nenhum resultado prático. Então o som de passos às suas costas fez com que se erguesse como uma mola. Os dois homens se aproximavam devagar, obstruindo o corredor com seus corpos musculosos:
"Olha só o que temos aqui", disse um deles.
Aquele era o momento crítico de sua missão, e ele estava sem sua arma. Mas tivera muito trabalho para chegar até ali e não podia se render sem luta. Percebendo que ele se colocava em guarda, o homem à sua esquerda abriu os braços:
"Calma, ninguém precisa se machucar aqui".
Foi esse homem que ele atingiu de raspão com um soco, enquanto o outro o agarrava e ambos rolavam pelo chão. Ele esperneou, chutou e até mordeu um dos homens, mas acabou subjugado numa gravata tão apertada que o fez perder os sentidos.
Quando acordou, ele se sentia atordoado, com a boca pastosa. No interrogatório, do qual lembrava apenas detalhes imprecisos, tinham usado drogas para fazê-lo falar. Mas ele estava. certo de que não revelara nada, fora treinado para resistir até ao soro da verdade.
A mulher que entrou no quarto nesse momento era jovem e bonita e sorriu para ele de um jeito amistoso.
"Está tudo bem com você?” •
A voz soava macia, os gestos, calmos. O inimigo mudava de tática e agora tentava seduzi-lo. Ele se levantou da cama e cambaleou até a janela.
"Você vai acabar se machucando de verdade", a mulher disse.
E apontou a pilha de livros sobre o criado-mudo. Livros baratos, de papel ordinário.
“Seria melhor você parar de ler essas, porcarias, estão piorando a sua cabeça.”
Por entre as grades da janela, ele viu o pátio cercado por muros altos. E ficou em dúvida por um instante. Só um instante. Ela ainda falou que aquelas tentativas de fuga atrapalhavam o tratamento. Mas ele sabia que o inimigo tentava confundi-lo. Queriam que ele ficasse em dúvida sobre quem era e o que estava fazendo ali.