domingo, 24 de janeiro de 2010

CRISTINA

de José Marcelo

MULHER DE VERMELHO - 4

O Cristo torto na parede, o sangue no canto da boca, o homem nu deitado sobre a cama. Imagine como isso realmente aconteceu.

Ele acorda com o som da batida. Um carro atropela e foge. A mulher ficou largada no meio da rua, a cabeça sobre uma poça vermelha que aumenta e aumenta. As luzes brancas do postes oscilam e brilham mais. O sangue escorre. Como vinho espalhando-se em uma toalha branca.

As pessoas passam. Param e ficam olhando. Ninguém ajuda.

De que adianta. A mulher já morreu mesmo. O homem parado à janela, sentindo o bafo quente de uma noite cheia de dentes podres. Ele conhece a mulher estirada no asfalto. Ele conhece aquela mulher: Cristina. Cristina, a puta.

Ele ligara para ela a pouco: “Preciso de você”.

“Você me tem”, respondera ela. Eles nunca falavam de dinheiro. Ela vinha. Sempre ao mesmo lugar. Sempre naquele hotel fudido. Quando ele dormia, ela pegava o dinheiro em sua carteira – nunca demais, sempre o preço certo – e partia. Mas não naquela noite. Naquela noite ela estava morta e com a cabeça despedaçada no asfalto.

Ele torna a deitar-se. Fecha os olhos mas torna a abri-los ao ouvir a porta ranger.

“Meu bem”, diz Cristina, entrando no quarto, repentina como uma aparição. “Meu bem, você viu aquilo?.”

Ele pisca. Ela não está mais lá.

 

 

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