quinta-feira, 19 de junho de 2008

O macaco e a água-viva - Fábula Japonesa

Shiyozushi no Kami, deus das águas e do mar, reuniu os habitantes do fundo do mar no castelo do dragão, onde vive, e pediu a todos que fizessem o máximo para que encontrassem um remédio que curasse a doença da sua filha. Como não conheciam nenhum medicamento para o mal da princesa, concluíram que, se o próprio Kami, deus dos mares, não sabia qual remédio curaria a princesa, muito menos saberiam eles; e calaram-se.

O silêncio foi quebrado pelo o polvo quando disse que se lembrava de uma conversa, entre os humanos, sobre doenças quando estivera na superfície. Disse que tinha ouviu deles que o fígado de macaco era um santo remédio porque curava tudo que era doença.

Pediram, então, ao próprio polvo que subisse à superfície e arranjasse um macaco, po is, por possuir oito pernas, ele seria o mais apto. Sabendo que a tarefa não era nada fácil, o polvo, por sua vez, indicou a água-viva, alegando que ela tinha um número bem maior de pernas. A água-viva sentiu-se honrada e aceitou cumprir a missão.

Antes que a água-viva partisse para a missão, descreveram-lhe o macaco como um animal de cara e traseiro vermelhos, muito inteligente e que vivia em árvores, nas ilhas do mar de Seto. Disseram a ela que os macacos daquela região gostavam de comer de tudo, principalmente castanhas e frutas frescas. Ela deveria convencer um deles a conhecer o castelo do fundo do mar sem, no entanto, contar-lhe a verdadeira razão da sua visita. Depois das orientações a água-viva partiu para a superfície.

Tão logo chegou às ilhas do mar de Seto, a água-viva avistou um macaco que descansava preguiçosamente numa árvore. Ela se aproximou e o chamou. Ele olhou para baixo e, admirado, pois era a primeira vez que avistara uma criatura como aquela, perguntou a ela a que reino ela pertencia. Ela respondeu que vivia em um lugar cheio de bosques, onde havia muitas árvores frutíferas, inclusive pés de caqui e de castanhas, de vários tipos.

Percebendo que o macaco se interessara, a água-viva o convidou para visitar o reino encantado do fundo do mar. Ele recusou o convite alegando não saber nadar. Ela o convenceu dizendo que o levaria nas costas. Ele então desceu da árvore e os dois se dirigiram para o alto mar.

O macaco era pesado, o que obrigava a água-viva a nadar vagarosamente. Na metade do caminho, ele reclamou da demora, pois queria chegar logo ao reino das frutas e castanhas. Ela, então, passou a falar sem parar, para distraí-lo. Passou também a elogiar os macacos, o que o deixou muito lisonjeado.

Ao notar que o macaco gostava de elogios, a água-viva disse, para entretê-lo, que ele e seus semelhantes eram considerados preciosos no seu reino. O macaco, curioso, quis saber a razão de animais de sua espécie serem tão apreciados pelos seres do mar. Ela disse que não podia contar a ele, pois era um segredo. Ele disse que tinha aceitado o seu convite porque confiava nela, e que ela também devia confiar nele. Ela finalmente disse que os macacos tinham a fama de curar doenças. Mas poupou-se de dar detalhes.

A água-viva nadava distraidamente, e quando o macaco, desconfiado e preocupado, perguntou a ela como ele seria capaz de curar doenças, ela disse que era algo que ele possuía, o seu fígado. Disse também que a filha do deus do mar estava muito doente e necessitava de um.

Temendo pelo seu fígado, o macaco lamentou-se dizendo que, não tendo sabido anteriormente, nada podia fazer para curar o mal da princesa. Questionado pela água-viva, respondeu que ela deveria ter-lhe contado sobre a princesa antes de deixar a ilha, pois não teria deixado o seu fígado no galho da árvore, onde ele descansava. Ele, então, propôs que voltassem para buscá-lo. A água-viva deu meia volta e nadou em direção às ilhas de Seto.

Quando o macaco alcançou a terra firme, correu para a árvore, subiu e deitou-se no galho. A água-viva, percebendo que o macaco demorava, o chamou para retomar a viagem. Ele se recusou e disse a ela que iria avisar todos os macacos para não lhe darem ouvidos, para não caírem na sua conversa. Ela voltou só ao fundo do mar.

Chegando lá, a água-viva contou aos seus companheiros o que havia acontecido. Disse que convencera um macaco a conhecer o castelo do dragão. Mas, no meio do caminho, como dera com a língua nos dentes, ele a fez voltar à ilha e a ludibriara. Como castigo, levou uma sova daquelas e teve os seus ossos quebrados. E é por isso que as águas-vivas são como são até hoje: molengas.

Com esta fábula, aprendi que devemos estar alerta contra certos seres que, mesmo que ingênuos na aparência, podem agir com segundas intenções, nos pegando pela nossa fraqueza. Mesmo um ser aparentemente simples pode tentar nos ludibriar e pôr em risco a nossa vida. Foi o que aconteceu com o macaco guloso: ele, que possui cérebro, por pouco não foi ludibriado por uma água-viva, um ser "acéfalo".

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